Se tudo correr bem, a partir das 04h03 (hora de Lisboa) desta segunda-feira, a sonda Solar Orbiter partirá em direcção ao Sol. O lançamento será feito da base do Cabo Canaveral (nos EUA) a bordo de um foguetão Atlas V. Nesta viagem, a sonda levará grandes objectivos como a caracterização dos pólos do Sol. As empresas portuguesas Active Space Technologies, Critical Software e Deimos Engenharia participaram no desenvolvimento da sonda.
O lançamento poderá ser acompanhado online a partir das 03h30 (hora de Lisboa). Caso seja adiado, por agora, o lançamento ainda poderá acontecer até 26 de Fevereiro. Inicialmente, a sonda deveria partir a 5 de Fevereiro.
Com 1800 quilos e cerca de três metros de altura, a Solar Orbiter é uma missão da Agência Espacial Europeia (ESA) com uma grande participação da NASA. Entre os grandes objectivos estão a observação e caracterização das regiões polares do Sol; a medição da atmosfera magnetizada do Sol com grande precisão; a identificação da relação entre a actividade na superfície do Sol e a evolução do núcleo da estrela; e a determinação das propriedades e dinâmicas do plasma e das partículas da heliosfera (uma bolha gigante de partículas electricamente carregadas produzida pelo Sol).
“Poder contemplar pela primeira vez os pólos do Sol é, sem dúvida, o mais importante que se fará nesta missão”, considerou Yannis Zouganelis, responsável científico adjunto da missão, em declarações ao jornal espanhol El País.
Para se explorarem todos os objectivos idealizados, vão viajar com a sonda dez instrumentos científicos. “É um veículo espacial espantoso. Tem dez instrumentos para estudar o Sol, mas, na realidade, cada instrumento é um conjunto com diferentes instrumentos, o que dá à Solar Orbiter uma capacidade tremenda”, explica ao site da BBC Ian Walters, responsável pelo programa da sonda na empresa Airbus.
Ao longo da sua jornada, o ponto em ficará mais perto da superfície solar será a 42 milhões de quilómetros. A esta distância, a sonda fotografará a superfície do Sol e medirá certas propriedades do seu ambiente. Apenas a sonda Parker Solar Probe da NASA esteve mais perto da nossa estrela. Aliás, a Solar Orbiter e a Parker Solar Probe complementam-se. “A Parker aproxima-se mais do Sol, mas só mede a temperatura e a quantidade de partículas, não tem instrumentos ópticos capazes de ver de onde vêm as partículas. Com a Solar Orbiter poderemos olhar para onde esteve a Parker e compreender melhor qual é a origem do vento solar”, esclarece Yannis Zouganelis.
Para evitar que derreta com o calor, a sonda leva um escudo térmico capaz de aguentar temperaturas até 500 graus Celsius. É aqui que entra a empresa portuguesa Active Space Technologies, que forneceu sistemas de protecção térmica que integram o escudo solar e que protegem os instrumentos científicos. Os sistemas de protecção são canais de titânio que funcionam como filtros e limitam o fluxo de calor que chega aos instrumentos para que não aqueçam demasiado ou derretam. “Esses canais são conjuntos de estruturas tubulares de cerca de meio metro de titânio com uma alta precisão mecânica e óptica e uma tolerância muito elevada ao calor”, descreve ao PÚBLICO Ricardo Patrício, responsável pelo desenvolvimento de negócio na empresa.
A Active Space Technologies também esteve envolvida nos testes do protótipo da Solar Orbiter ao equipá-lo com cerca de 140 modelos térmicos e estruturais que simulam a vibração e aceleração durante o lançamento. A empresa fabricou ainda componentes de titânio para um braço retráctil que suporta instrumentos muito sensíveis aos campos magnéticos.
“Os mecanismos fornecidos pela Active Space permitem aos instrumentos científicos observar o Sol quando estão em operação e protegem-nos das elevadas temperaturas ao manter a sua integridade e operacionalidade durante a missão”, afirma Ricardo Patrício. O desenvolvimento destes projectos representa uma facturação de 1,8 milhões de euros. Ao todo, a missão custou cerca de 1500 milhões de euros.
Impactos das tempestades solares
Uma das “boleias” da Solar Orbiter será Vénus. Através da gravidade do planeta, aproximar-se-á do Sol. A Critical Software esteve precisamente envolvida no desenvolvimento de vários sistemas de software da sonda, como os de comando e controlo central, detecção e recuperação de falhas, assim como os de gestão de comportamento térmico. “Também suportamos a parte da aviónica, em contacto directo com o ESOC (Centro Europeu de Operações Espaciais)”, refere Ricardo Armas, responsável pelo desenvolvimento de negócios da Critical Software, num comunicado da Agência Espacial Portuguesa. Por sua vez, Mauro Gameiro, engenheiro principal da empresa, pormenoriza que o software desenvolvido garante que a sonda está no “caminho certo”, “os instrumentos secundários estão a funcionar devidamente” e que “todo o sistema de detecção de falhas funciona de forma correcta”.
Já a Deimos Engenharia definiu e executou a estratégia para testar os sistemas de voo da sonda. Analisou ainda os resultados desses testes. Isto foi fundamental para que a Solar Orbiter estivesse pronta para a grande viagem. “Dezenas de testes e um número ainda maior de relatórios envolvendo equipas numerosas foram coordenados na perfeição, alcançando com sucesso um marco chave do projecto, a chamada ‘qualification and acceptance review’, a tempo de autorizar o lançamento do satélite na data prevista”, afirma no comunicado Nuno Silva, gestor na Deimos Engenharia.
Além de nos dar mais conhecimento sobre o Sol e satisfazer a nossa curiosidade, a missão poderá servir para minimizar os impactos das tempestades solares. Afinal, a sonda vai observar ventos e erupções solares. As erupções solares podem ter impacto na Terra ao atingir sistemas eléctricos sensíveis, interromper comunicações por satélite e causar a falha de redes de energia.
No comunicado exemplifica-se que, em 1989, uma erupção solar causou um apagão na rede eléctrica do Canadá, o que deixou aproximadamente seis milhões de pessoas sem energia durante nove horas. A ESA estima mesmo que este tipo de acontecimentos possa levar a prejuízos de 20.600 milhões de euros na economia europeia em 2024. Agora, uma missão que vai durar, pelo menos, sete anos vai passar a pente fino o Sol para nos ajudar a evitar esses problemas.